Domingo, 22 de fevereiro de 2009, 10h57 Atualizada às 17h44
Motoko Rich
Foi o momento surpreendente pelo qual Stephanie Rosalia estava esperando. Um grupo da quinta série se amontoou em torno dos computadores da biblioteca da escola, sob supervisão de Rosalia, e acessou o allaboutexplorers.com, um website que, sem as crianças saberem, foi intencionalmente recheado de fatosfalsos. Rosalia, bibliotecária da Escola Pública 225, uma instituição deensino fundamental e médio da seção de Brighton Beach no Brooklyn, NovaYork, pediu cautela. "Não respondam às perguntas com a primeira informação que encontrarem," ela alertou.
A maioria dos alunos a ignorou, como ela já previa. Mas Nozimakon Omonullaeva, 11, notou algo estranho na página sobre Cristóvão Colombo."Aqui diz que os índios gostaram dos celulares e computadores trazidos porColombo!" Nozimakon exclamou, apontando para a tela. "Isso está errado."
Foi uma descoberta essencial em uma aula sobre a confiabilidade - ou a faltade - das informações na internet, uma das muitas que Rosalia leciona em seu papel como um novo tipo de bibliotecário escolar.
Rosalia, 54, faz parte de um grupo em expansão de especialistas em multimídia do século XXI, que ajuda a guiar alunos pelo oceano digital deinformação que confrontam diariamente. Esses novos bibliotecários acreditamque a alfabetização inclui, mas também vai além, dos livros. "Os dias em queapenas devolvia os livros às estantes acabaram," disse Rosalia, que chegou àEscola Pública 225 há quase seis anos, após se formar como primeira daclasse na Escola de Pós-Graduação de Biblioteconomia e Estudos de Informaçãoda Faculdade Queens. "Essa é a era da informação e a tecnologia trouxe umageração de práticas inteiramente nova."
Alguns desses novos bibliotecários ensinam as crianças a criar apresentaçõesem PowerPoint ou vídeos online. Outros fazem com que os alunos usem sites deredes sociais para debater assuntos de História ou comentar sobre as redações dos colegas. Contudo, embora cada vez mais os bibliotecários escolares ensinem aos alunos habilidades importantíssimas, necessárias não apenas na escola, como também no trabalho e no dia-a-dia, eles são asprimeiras vítimas dos enxugamentos orçamentários das escolas.
Mesa, o maior distrito escolar do Arizona, começou no ano passado a despedirbibliotecários da maioria de suas escolas. Em Spokane, Washington, odistrito escolar diminuiu em 2007 as horas dos bibliotecários, gerando umprotesto de pais da região. Mais de 90% das escolas públicas americanas têmbibliotecas, segundo estatísticas federais, mas menos de dois terços possuembibliotecários certificados trabalhando em período integral.
Lisa Layera Brunkan, mãe de três em Spokane, disse que reconheceu aimportância da bibliotecária escolar quando sua filha, com sete anos naépoca, lhe mostrou um projeto em PowerPoint. "Ela disse, 'a bibliotecária meensinou'," lembrou Brunkan. "Fiquei impressionada."
Os bibliotecários escolares ainda combatem a impressão de que exercem um papel tangencial.
As aulas de Rosalia são freqüentemente canceladas na última hora, quando os professores regulares tentam encaixar aulas preparatórias para testes mais convencionais. Metade da classe da quinta série saiu no meio de uma recentesessão sobre avaliação de websites porque as crianças iam se apresentar emum show de talentos."
Você prepara as coisas para que sigam uma seqüência lógica e acontece algo que estraga tudo," Rosalia disse. "Estamos ensinando os alunos a pensar. Mas às vezes a Diretoria Escolar parece querer que eles aprendam a marcar alternativas."
Na cidade de Nova York, Rosalia é uma relativa raridade. Apenas cerca de um terço das escolas públicas da cidade possui bibliotecários certificados, e não é obrigatório que escolas de ensino fundamental tenham tais profissionais. Rosalia gerenciou salões de beleza com seu marido e foi voluntária nas bibliotecas de seus filhos antes de fazer a pós-graduação. Ela foi contratada para a Escola Pública 225 pelo diretor Joseph Montebello, irmão de uma bibliotecária do ensino médio no Brooklyn. Na escola, a apenasuma quadra de uma parte tumultuada da Brighton Beach Avenue, com barracas defrutas amontoadas e padarias russas, Rosalia enfrenta alguns desafios especiais. Mais de 40% dos alunos são imigrantes recentes. Barreiras delíngua forçam Rosalia a ajustar sua coleção de livros para leitores que,embora estejam na sétima série, ainda lêem em nível de segunda série. Antes de Rosalia chegar, a biblioteca era gerenciada por um professor sem treinamento em biblioteconomia. Alguns livros da coleção ainda descreviam a Alemanha como duas nações e outros se referiam à União Soviética como se amesma ainda existisse. Rosalia eliminou centenas de títulos. Trabalhando comapenas US$ 6,25 para cada estudante por ano - em comparação ao valor médio nos EUA de US$ 12,06 - ela trouxe volumes sobre hip-hop e mágica, e títulos populares como Oh Yuck! The Encyclopedia of Everything Nasty ("Que Nojo! A Enciclopédia de Tudo que é Nojento", em tradução livre). Com a ajuda dedoações do conselho da cidade e de corporações, ela conseguiu um quadro branco interativo e 29 laptops.
Rosalia se apresentou a seus novos colegas como "professora de alfabetizaçãode informação" e convidou os professores para colaborar com as aulas. Asprimeiras sessões focavam em como encontrar livros e bancos de dados, e em habilidades básicas de pesquisa.
Logo Rosalia passou a ensinar os alunos a fazer perguntas mais sofisticadas durante os projetos de pesquisa, a decodificar os endereços de internet e aavaliar os autores e o viés dos conteúdos dos sites. Até mesmo osprofessores acreditam aprender com Rosalia. "Eu sabia que nem tudo na internet é verdadeiro," disse Joanna Messina, que começou a levar suas turmas de quinta série à biblioteca este ano. "Mas não diria que avalio osite inteiro ou procuro seus autores."
Combinando a nova e a antiga alfabetização, Rosalia convida os alunos aescrever resenhas de livros que ela coloca no catálogo online da biblioteca.Ela ajudou um professor de matemática a criar um blog. Ela pede para que os alunos usem os bancos de dados eletrônicos com links na página da biblioteca.
Mas nem todos os esforços de Rosalia envolvem tecnologia. Ao final de cada semana, Rosalia abre a biblioteca para que as turmas venham unicamente com o intuito de olhar os livros. Na semana passada, ela usou uma camiseta com afrase "não me faça usar minha voz de bibliotecária." Indo de criança emcriança, ela rapidamente pegava os volumes das estantes enquanto os alunos da terceira série lhe pediam livros sobre tubarões e assuntos de terror. No final do período, mais de 30 estudantes estavam na fila de empréstimos.
Mesmo assim, Rosalia entende o fascínio pela internet. No último outono americano, ela falou a uma dúzia de alunos da sétima e oitava séries que haviam recentemente imigrado da Rússia, Geórgia, China e Iêmen, e teve dificuldade para se comunicar. "Temos jornais em todas as suas línguas,"disse. E se virou para o quadro branco digital. Quando clicou na página do Izvestia, jornal de Moscou, os russos do grupo se animaram.
"Alguém gosta de livros?" Rosalia perguntou. Vários estudantes olharam para ela inexpressivamente. Os russos, que falavam um pouco de inglês, balançaram a cabeça. Então Rosalia entrou no site da revista Teen People, e KatsiarynaDziatlouskaya, 13, imediatamente reconheceu a foto de Cameron Diaz. Rosalia percebeu que havia criado um vínculo. "Vocês podem ver revistas, jornais,imagens, programas de computadores, websites," Rosalia disse. "Vocês podemler o que quiserem, mas precisam ler mesmo. Combinado?"
Tradução: Amy Traduções
The New York Times
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